quinta-feira, 16 de julho de 2009

Juiz revoga portaria que disciplinava trajes para entrada no fórum de Mâncio Lima (AC) Mas, não deveria!


Durou apenas 20 dias a portaria do juiz de direito substituto José Wagner Pedrosa, da comarca de Mâncio Lima (AC), cujo parágrafo único considerava inadequados à frequência no fórum da cidade pessoas vestindo bermudas, shorts, calções, camisetas regatas, minissaias, miniblusas ou trajes semelhantes.

Pressionado pelo Ministério Público Estadual, magistrados e a opinião pública, o juiz revogou nesta quarta-feira a polêmica portaria que disciplinava os trajes para ter acesso ao fórum de uma das cidades mais pobres da Amazônia. A partir de hoje, a população de Mâncio Lima não terá que ser submetida à triagem que era feita por um sargento do Exército.

Ao revogar a portaria, o magistrado justificou sua decisão por conta da repercussão negativa gerada pela medida.

Mâncio Lima está localizado a 617 quilômetros de Rio Branco, a capital, na região mais ocidental do país, às margens do Rio Moa. Possui 13,7 mil habitantes, com baixa densidade demográfica - 2,50 hab/km. No município está o Parque Nacional da Serra do Divisor, na fronteira com o Peru.

O município concentra suas atividades produtivas na agricultura, sendo a macaxeira (mandioca) o principal produto, usado na fabricação da famosa “farinha de Cruzeiro do Sul”, conhecida em outras regiões por sua excelência.

No mês passado, o juiz resolveu que qualquer menor de 18 anos que for flagrado nas ruas da cidade, após as 23 horas, cometerá infração e deverá ser retirado das ruas. A decisão do Juiz considerou diversos aspectos do Estatuto da Criança e do Adolescente, conflitantes com os costumes do município.

Muitos menores passavam a madrugada nas ruas, em clubes ou bares. Segundo o juiz, a iniciativa visa complementar um papel de orientação que deve ser desempenhado pelas famílias, escolas, igreja e demais órgãos responsáveis.

Ao ser encontrados nas ruas, os menores são encaminhados aos pais mediante termo de responsabilidade. No caso de bares e clubes, mesmo acompanhados dos pais ou responsáveis, quando o local oferecer algum risco para a integridade moral, mental, física ou social, deverá ser feita intimação para que os menores sejam imediatamente retirados.

Nesta manhã, por telefone, antes de presidir um júri em Mâncio Lima, o juiz José Wagner Pedrosa conversou com a reportagem:

Blog da Amazônia -Por que o senhor tentou disciplinar trajes para entrada no fórum de Mâncio Lima?
José Wagner Pedrosa - Tentamos isso para resguardar o respeito à Justiça. Não é verdade o que andaram dizendo, que o acesso ao Judiciário estava sendo impedido pela portaria. Nós entendemos que o acesso ao Judiciário não significa acesso ao prédio, mas à Justiça como prestação juridicinal, ou seja, como prestação de serviço. O cidadão não precisa adentrar no fórum para ter acesso ao Judiciário. Uma outra qustão é o seguinte: o respeito se demonstra sim pela roupa. A pessoa demonstra o estado de espírito dela pela forma como está vestida. Se vou para um banho, não visto terno e gravata. Se vou para um casamento, não vou de bermuda. Nesse sentido, quem vem ao fórum tem que demonstrar respeito e esse respeito é medido pel nossa cultura.

Como assim?
As pessoas têm que parar com essa mania de achar que os aspectos culturais podem ser separados das questões de comportamento. Um exemplo disso: se alguém tentar entrar de cueca aqui fórum, garanto que todos vão achar errado, porque culturalmente achamos isso errado. Não existe nenhuma lei que proíba.

Mas doutor, conheço Mâncio Lima. É uma cidade pequena, com muita gente pobre castigada pela malária. Não é exagerado se exigir determinada roupa para que a população possa ter acesso ao fórum da cidade?
Não há excesso. Eu sou do Nordeste, a região mais pobre do Brasil. Sou nordestino, pernambucano, do alto sertão. Sou de Afogado da Ingazeira. Tenho um primo que tem dia que só falta o que ele comer, mas não falta uma calça no guarda-roupa dele. Pode ter só uma, mas ele tem. Quem reclamou de minha portaria não foi o povo, quem reclamou foi gente de posição, que tem dinheiro, que tem condição de andar de calça e camisa social. As pessoas passaram a comparecer bem vestidas ao fórum depois da portaria. Aliás, eu até pedi para que não fosse feita a divulgação da revogação para que elas continuassem vindo bem vestidas. Elas vinham ao fórum com qualquer roupa porque não tinha orientação.

O senhor sempre comparece ao fórum de terno e gravata?
Sim, sempre. Faço questão. Mas a portaria não exigia que ninguém viesse de terno e gravata, de calça nova. A calça podia estar rasgada. Se a única calça que a pessoa possuía estava rasgada, ela podia vir. O que eu queria é que elas, quando entrassem aqui no fórum, mostrassem respeito. Uma mulher, por exemplo, que não tem uma saia longa deve repensar os seus conceitos. Elas compareciam com certas roupas que poderiam dar ensejo ao cometimento de um crime aqui dentro das dependências do fórum.

Se a portaria era tão positiva porque o senhor revogou?
Isso causou muita repercussão entre as pessoas instruídas, que têm meios de chegar à Corregedoria do Tribunal de Justiça. E isso causou uma polêmica tão grande que eu decidi não polemizar. Se a República brasileira dependia de uma portaria que buscava regulamentar o uso das roupas, salvei a República revogando a portaria.

Blog do Acreucho: É por causa deste tipo de atitude, da pressão que foi feita, inclusive por pares ao juiz, que o Brasil é culturalmente atrasado.

Tem toda razão o Juiz quando argumenta que as pessoas "precisam ter respeito pela Justiça", e não só pela Justiça, mas, por qualquer orgão do setor público, isso é o que justamente falta ao nosso povo, respeito e orientação. Os argumentos do Juiz são totalmente coerentes. Mesmo o mais pobre dos brasileiros tem uma roupa que pode ser considerada "decente".

Aqui em Rio Branco, voce não entra ou não entrava, nas dependências da Prefeitura, por exemplo, de bermudas. Creio que também nos demais orgãos dos poderes municipais, estaduais e federais isso seja praxe. Comparecer a uma audiência num foro vestindo bermuda, camiseta regata, mini-saia (muito curta) como disse o Juiz, demonstra o quanto a pessoa respeita ou não aquele orgão público.

Em Brasília voce não entra nas dependências do Congresso Nacional, sem estar de paletó e gravata. Mâncio Lima é tão brasileira quanto Brasília, porque as Leis teriam que ser diferentes?

Simplicidade no vestir não quer dizer relaxamento, nem falta de respeito para com as outras pessoas. Mas, aqui na parte "mais ocidental da amazônia", o relaxamento começa pelas autoridades, em raras oportunidades se vê o governador e seus assessores, por exemplo, vestindo terno e gravata, solenidades são feitas em "mangas de camisa", quando vestem paletó e gravata, estão com calças jeans e tenis, demonstrando um mau gosto enorme. Políticos, deveriam pelo menos "fazer o sacrifício" de se vestir bem. Esse tipo de atitude é uma tentativa de se "tornar igual" ao povo, vestindo-se igual a eles, quando na realidade o pensamento geral da politicália é o mesmo do Lula: Com dez reais, o pobre se contenta".

Nenhum funcionário público pode ir trabalhar de regata ou bermuda, (também não deveria poder de mini-saia) porque teria que atender uma pessoa assim vestida?

Este tipo de regulamentação, do uso adequado de vestuário em orgãos públicos, não deveria ser regulado por "portaria", mas deveria virar Lei, aprovado pelo Congresso.



2 comentários:

  1. Dr Wagner está de parabens, conheço ele como uma pessoa simples e correto.o objetivo de se dedicar a magistratura nada mais é do contribuir para melhorar a vida de pessoas que não tem voz ativa, é uma pessoa que pensa no bem estar coletico. humano erealizador e dedicado.
    que Deus esteja sempre abençoando vc.

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  2. Discordo da sua conclusão. Quem julga ou deveria julgar o que é apropriado ou não para se vestir é a própria pessoa.

    O que demonstra ou não respeito a justiça não são os trajes que você veste, mas a maneira pela qual você se comporta perante ela.

    O termo órgão PÚBLICO perde o sentido quando você proíbe livre acesso a tal repartição. Isso é interferir no direito constitucional e supremo de ir e vir do cidadão, é um atentado a cidadania, uma afronta à dignidade da pessoa. Tornar isso lei? Faça me o favor... Existem coisas muito mais importantes para serem votadas.

    Fazendo minhas as suas palavras iniciais, é por causa deste tipo de atitude que o Brasil é culturalmente atrasado. Atitude ditatorial e ignorante. Viva a república jurássica brasileira, sem maiúscula mesmo.

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