quarta-feira, 13 de agosto de 2008

A nova Classe Média brasileira...

Do Blog do Ricardo Noblat

Uma classe sem rosto definido

Murillo de Aragão é mestre em Ciência Política, doutor em Sociologia pela UnB.

Até a República Velha, a classe média brasileira praticamente não existia, segundo Luiz Carlos Bresser Pereira. Para ele, era um pequeno “estamento de servidores públicos e de profissionais liberais ligados ao estado e à classe patriarcal proprietária de terras”. No período entre 1930 e 1980, com a industrialização, cresceu a médias robustas e, como conseqüência – entre 1930 e 1960 – surgiu uma classe média “privada”, composta de empresários do comércio, indústria e agricultura que se juntaram aos funcionários públicos e de empresas estatais como Correios, Banco do Brasil, Petrobras, Eletrobrás, BNDE, entre outros, como os integrantes das forças armadas.

Com a estagnação do país a partir de 1980, a classe media encolheu e perdeu relevância econômica e política, uma vez que setores da alta classe média sofreram redução de renda e representatividade. Agora, por força de um período de estabilidade e crescimento, iniciado com o Plano Real em 1994, surge uma nova classe média – oriunda das classes populares e beneficiada pelos programas assistencialistas do governo e pela expansão do emprego formal.

Na semana passada, duas importantes pesquisas recentes – uma do IPEA e outra da FGV – confirmaram que a classe média (52% da população) é a maior de todas. A notícia é evidentemente auspiciosa. Curiosamente, o mesmo Plano Real que promoveu o empobrecimento da classe media alta – quando eliminou as vantagens do cheque pré-datado, dos tabelamentos de preços (de escolas, planos de saúde e alugueis) e a lucratividade das aplicações overnight – abriu caminho para o fenômeno que ora estamos vivendo: a emergência de uma nova classe média.

No entanto, apesar das óbvias e merecidas saudações pelo fenômeno, algumas questões não foram devidamente consideradas. Em primeiro lugar, apesar do seu tamanho, a classe media é tão dividida quanto o PMDB. O intervalo de renda entre a classe média pobre e a classe média rica é muito grande, tornando seus interesses e as aspirações difíceis de serem medidos, já que existem várias “classes médias”.

A emergente, usando a expressão de Márcio Pochmann, é aquela que saiu das classes D e E e ascendeu para a classe C, o extrato inferior da antiga classe média. Ao falar dela, devemos ter claro que em um país de dimensões continentais e com realidades econômicas distintas, é penoso admitir que alguém que ganhe dois mil reais por mês em São Paulo enfrente as mesmas realidades de quem ganha à mesma quantia no Piauí ou no Amapá. O poder de compra varia profundamente entre as regiões, de forma que o mesmo salário resulta em inserções diferenciadas.

Assim, mesmo que se possa falar em satisfação da maioria de seus integrantes, o grau de satisfação não é unânime. Outro aspecto a considerar é o efeito político do fato. Será que a classe média vai decidir as eleições de 2010? Sim e não, pois, conforme ponderei existem várias classes médias. Devemos considerar pelo menos uns quatro segmentos alocados nas faixas de renda pertencentes à média. Logo, diante dessas constatações, nova situação se apresenta, com evidentes repercussões políticas. E não apenas pelas diferenças econômicas regionais e distintas realidade econômicas.

Num país de dimensões continentais, os contrastes são significativos. Temos cinco regiões geográficas delimitadas, porém, mesmo em cada uma delas existem importantes diferenças. A problemática não pára por aí. Prossegue em outras dimensões. A principal delas se encontra no desafio de definir o que seja classe média.

Murillo de Aragão é mestre em Ciência Política, doutor em Sociologia pela UnB e presidente da Arko Advice – Análise Política.

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